Desejo de leitura





Imagem sobre Desejo de leitura,

Certa vez, quando aluno do ensino médio, desejei ler um bom livro. Então, comecei a lê-lo. O autor escrevia muito bem. A leitura seguia fluida numa prosa finíssima e involuta. Havia momentos em que minha testa franzia de absorta circunspecção. Podia transpirar. E assim foi nas primeiras 40 páginas, e a história permanecia imperdível. Mas num determinado momento, minha mente já não mais se concentrava. Meus olhos fechavam-se, desviavam-se e minha atenção dilatava-se. Minha memória, antes próspera em somar registros, não conseguia mais guardar palavras. Tudo era esquecido após duas páginas. Nos capítulos seguintes, o que era antes prazer e deslumbramento, tornou-se martírio e enfado. Algo acontecera comigo. Talvez fosse a incômoda ansiedade com o estudo, as notas, ou algum stress cotidiano intentando a hecatombe. Não sei bem, só sei que tudo ficou mais difícil: a concentração, a assimilação, a acomodação e a equlibração. Não conseguia ir adiante. Então, lancei mão do estatuto do leitor e coloquei o livro de lado.

Passaram-se algumas semanas, talvez meses, e mais tarde defrontei-me com um acontecimento vital, como se um transeunte passasse por mim e mudasse minha direção. Dormia mal de preocupações. Meus olhos embotavam-se de melancolia e vermelhidão. A vida havia me reservado uma surpresa. Acontecera algo que quebrara a normalidade. Meus conceitos e preferências – delgadamente, para que eu não admitisse envergonhado – começaram a mudar. Mas quem jamais deixou de experimentar situação semelhante? Até que olhei aquele livro já um pouco empoeirado e cheirando a esquecido. Era um dia pálido e chuvoso. Não havia para onde ir e nem o que fazer de espetacular. Então, recomecei a leitura e vi como eu tinha sido ingrato para com ele. Como suas páginas aclararam minhas vistas e interpelaram meu coração. Não consegui parar até o final.

Escola é assim também, como um bom livro, e como bom livro, deve ser lido até o final. Os motivos que me levaram a desistir da leitura do livro foram os mesmos que me levaram a lê-lo novamente até o fim: as situações contrárias da vida. A nossa relação com a escola deve ser de perseverança. Principalmente quando está chovendo, precisamos dar rumo aos nossos passos, não temos para onde ir e ninguém para compartilhar. Certamente, há momentos em que as circunstâncias da escola fazem o aprendente desistir. Entretanto, há razões externas que também desmobilizam sua ação e seu desejo de aprender. Indiferentes à qualidade do ensino, alunos desistem, como desistimos, de quando em vez, da leitura de um bom livro, porém, não lemos por imposição das palavras, mas dos sonhos.





* campos obrigatórios




enviando e-mail
Ocorreu um erro. Tente novamente!
Enviado com sucesso!
e-mail inválido