Maneiras de ver o saber





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“É na avaliação do saber das crianças, quer quando recém-chegam à escola, quer durante o tempo em que nela estão, a escola, de modo geral, não considera o ‘saber de experiência feito’ que as crianças trazem consigo. Mais uma vez, a desvantagem é das crianças populares. É que a experiência das crianças das classes médias, de que resulta seu vocabulário, sua prosódia, sua sintaxe, afinal sua competência lingüística, coincide com o que a escola considera o bom e o certo.”  (Paulo Freire)

Conta-se que, numa pequena cidade do interior fluminense, bucólica e barrenta, uma grande emissora de TV foi realizar uma reportagem para aferir o grau de instrução e de conhecimento das populações que viviam nas áreas rurais, sem muito acesso à escola. Havia naquela região apenas duas escolas públicas: uma oferecia tão-somente o ensino fundamental, a outra, não com muitas vagas, atendia àqueles que desejavam seguir um pouco mais adiante nos estudos, através do ensino médio, onde aprendiam algumas matérias que poderiam se relacionar com o cotidiano local, de vida familiar no campo, um pequeno comércio na cidade e uma indústria pecuarista subnutrida.

Ao passar pelas pequenas ruas, que dividiam espaços com cachorros, cavalos, automóveis e algumas charretes e carros de boi, a produção do programa de TV encontrava passantes que sempre cumprimentava os visitantes, com naturalidade familiar e cerimônia quase religiosa.

Ao perceber um velho campeiro sentado nos degraus de uma loja de ração, a repórter perguntou:

- O senhor sabe o nome do presidente do Brasil?

- Sei não, senhora.

- O senhor sabe o nome da capital do Brasil?

- Sei não, senhora.

- O senhor sabe, pelo menos, o nome do prefeito desta cidade?

O campeiro sorriu e disse:

- Sei também não, senhora…

A jornalista chamou para si o cinegrafista que tudo filmava e, olhando para a câmera, disse:

- Vejam, senhores telespectadores, como nosso povo ainda vive na falta de instrução.

O homem não se fez por rogado e chamou:

- Moça! Favor…

- Pois não, senhor.

- A senhora sabe me dizer o nome daquele pássaro ali?

- Não, senhor.

- E daquele outro ali?

- Também não – respondeu a moça, já um pouco constrangida.

- E daquela árvore, a senhora sabe o nome?

A moça emudeceu.

- Pois é, – seguiu o matuto em tom de discurso – veja, gente da minha terra, como nosso povo ainda vive na falta de instrução…





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